Da “festa do castigo” à “alegria necessária”: Nietzsche e a invenção do abolicionismo penal

Autores

DOI:

https://doi.org/10.18316/redes.v9i3.7181

Palavras-chave:

Abolicionismo penal, Nietzsche, Niilismo

Resumo

O artigo tem por objetivo a redescrição dos saberes penais a partir das lentes niilistas da filosofia de Nietzsche, desenvolvendo relações entre seu pensamento e o abolicionismo penal. Desde o advento do paradigma positivista, no século XIX, os saberes penais interromperam consideravelmente seu diálogo com a filosofia, mergulhando no discurso da ciência. Ocorre que, desde Nietzsche, o saber filosófico viveu profundas mudanças que permitiram o surgimento de projetos filosóficos pós-metafísicos com os quais os saberes penais não tiveram, ainda, oportunidade de dialogar suficientemente. O artigo, então, propõe a necessidade urgente de retomada do diálogo entre saberes penais e filosofia, a partir de uma perspectiva pós-metafísica. De início, faz um breve mapeamento dos discursos abolicionistas. Após, trata do niilismo e da forma como ele se manifestou na tradição cultural do ocidente para, depois, observar a crítica de Nietzsche ao direito penal (“festa do castigo”) e às noções de sujeito, dolo e culpabilidade. Sugere, então, a invenção do discurso abolicionista na proposta nietzschiana de uma sociedade sem direito penal (“alegria necessária”). A metodologia utilizada é genealógica e bibliográfica: promove garimpagem na obra do filósofo alemão para de lá extrair pensamento penal. Conclui que o abolicionismo pode ser redescrito como a consumação do niilismo operando na razão penal e Nietzsche como o primeiro abolicionista penal consumado.

Biografia do Autor

Lucas Villa, Universidade Federal do Piauí - UFPI

Doutor em Direito pelo Centro Universitário de Brasília, Mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Piauí. Professor adjunto da Universidade Federal do Piauí (UFPI) e do Instituto de Ensino Superior (ICEV). Advogado criminalista.

Referências

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Minimalismos, abolicionismos e eficientismo: a crise do sistema penal entre a deslegitimação e a expansão. Revista Sequência, nº 52, p. 163-182, jul. 2006.

BADARÓ, Tatiana. Garantistas vs. abolicionistas: as críticas de Ferrajoli ao abolicionismo penal e as réplicas abolicionistas ao garantismo penal. In: Quaestio Iuris, vol. 11, nº 02, Rio de Janeiro, 2018.

BENOIT, Blaise. Nietzsche: da crítica da lógica do direito penal ao problema da concepção de um novo direito penal? Dissertatio, UFPel [38,2013].

BENOIT, Blaise. Versuch e genealogia. O método nietzschiano: “dinamitar” o bom senso ou fazer advir uma concepção corporal da razão? Dissertatio [33] pp. 63–86, inverno de 2011.

BOLDT, Raphael. Processo penal e catástrofe: entre as ilusões da razão punitiva e as imagens utópicas abolicionistas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018.

CARVALHO, Salo de. Antimanual de criminologia. São Paulo: Saraiva, 2015.

CHRISTIE, Nils. A Indústria do Controle do Crime. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

CHRISTIE, Nils. Conflicts as property. In: The British Journal of Criminology, Volume 17, Issue 1, January 1977.

CHRISTIE, Nils. Uma razoável quantidade de crime. Rio de Janeiro: Revan, 2011.

COHEN, Stan. Against criminology. New Brunswick: Transaction, 1988.

GUAGLIARDO, Vincenzo. De los Dolores y las penas: ensayo abolicionista y sobre la objeción de consciencia. Madrid: Traficantes de Sueños, 2013.

HAAN, Willem de. Abolitionism and crime control: a contradiction in terms. In K. Stenson and D. Cowell (Eds.) The Politics of Crime Control, London: Sage, 1991.

HEIDEGGER, Martin. Nietzsche. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.

HULSMAN, Louk. Temas e conceitos numa abordagem abolicionista criminal. In: Verve, 3:190–210, 2003

KHALED JUNIOR, Salah Hassan. A busca da verdade no processo penal: para além da ambição inquisitorial. Rio de Janeiro: Atlas, 2014.

MATHIESEN, Thomas. The The politics of abolition revisited. Vancouver: Routlege, 2014.

MCLAUGHLIN, Eugene; MUNCIE, John. Diccionario de criminologia. Barcelona: Editorial Gedisa, 2003.

NEHAMAS, Alexander. Nietzsche: life as literature. Harvard: Harvard University Press, 2002.

NIETZSCHE, Friedrich. A filosofia na era trágica dos gregos. São Paulo: Hedra, 2008.

NIETZSCHE, Friedrich. A genealogia da moral: uma polêmica. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

NIETZSCHE, Friedrich. A vontade de poder. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008.

NIETZSCHE, Friedrich. Além do bem e do mal. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

NIETZSCHE, Friedrich. Aurora: reflexões sobre preconceitos morais. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

NIETZSCHE, Friedrich. Escritos sobre direito. Rio de Janeiro: PUC-RIO, 2009.

NIETZSCHE, Friedrich. Fragmentos finais. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 2002.

NIETZSCHE, Friedrich. Humano, demasiado humano. São Paulo: Escala, 2006.

NIETZSCHE, Friedrich. Humano, demasiado humano: um livro para espíritos livres – Volume II. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

NIETZSCHE, Friedrich. O crepúsculo dos ídolos. São Paulo: Companhia de Bolso: 2017.

NIETZSCHE, Friedrich. Sämtliche Werke: Kritische Studienausgabe. Band 12. Berlin: de Gruyter, 1999.

PASUKANIS, Eugenij. Teoria geral do Direito e o marxismo. Rio de Janeiro: Renovar, 1989.

RODRIGUES, Ricardo C. de Carvalho. Há uma oposição entre o abolicionismo penal, o minimalismo penal e o direito penal mínimo? In: Revista Eletrônica de Direito Penal e Política Criminal – UFRGS, vol. 4, nº 1, 2016.

SIM, Joe. The abolitionist approach: a British perspective, In Penal Theory and Practice: Tradition and Innovation in Criminal Justice, Manchester: Manchester University Press, 1994.

SWAANINGEN. René van. Critical Criminology: Visions from Europe. Londres: Sage, 1997.

VARELA, Francisco J.; THOMPSON, Evan; ROSCH, Eleanor. The embodied mind: cognitive science and human experience. Massachusetts: Massachusetts Institute of Technology Press, 1993.

VATTIMO, Gianni. O fim da modernidade: niilismo e hermenêutica na cultura pós-moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

VILLA, Lucas. Hegemonia e estratégia abolicionista: o abolicionismo penal como negação da crueldade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2020.

VILLA, Lucas. O demônio de Nietzsche: niilismo, eterno retorno e ética do cuidado de si. Teresina: Nova Expansão Gráfica e Editora, 2012.

ZAFFARONI, Eugenio Raul. Em busca das penas perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 2012.

Downloads

Publicado

2021-10-20

Edição

Seção

Artigos